Postagens

Mostrando postagens de dezembro, 2023

Da série psicanálise & provocações ( IV)

A felicidade e a bem-aventurança do viver  Por Gilvaldo Quinzeiro  1- A  felicidade, esta senhora, que nos acena , mas nunca aparece nos encontros é filha de quem? Se veste de quê? Dorme com quem? 2 - Na justa virada de ano, todos nós estamos a espera de 2024, as praias estão lotadas; as estradas em  engarrafamentos; os retiros espirituais em barulhos dos louvores; os que antes só se vestiam de cores variadas, agora se vestem de branco: é a busca da felicidade, a Coca-Cola , dos mais espiritualizados. 3 - Como no rio de Heráclito no qual ninguém se banha duas vezes, cada dia é  uma despedida. 4 - Viver é se despedir todos os instantes! É mergulhar fundo sem se afogar no raso de nenhuma coisa! 5 -Bem-aventurado seja quem for capaz de melhor se despedir e conseguir imprimir no outro a saudade do seu cheiro! 6- Bem-aventurado seja quem souber silenciar  no exato momento em que o outro só quer mesmo ser ouvido! 7 - Feliz, não é quem prova do mel,  mas quem sabe a quem agradecer por decidir

Da série psicanálise & provocações (III)

Eros, este filho de uma puta? Por Gilvaldo Quinzeiro  1 - Eros , do erótico , do erotismo, é a “cachaça “ presentes nas queixas de todos os humanos quando vão consultar  aos altares, aos  padres, aos  pastores, aos gurus, as cartomantes e aos analistas . 2 - Eros, aquele que nunca se torna adulto, é filho de Afrodite (deusa do amor) e Ares ( deus da  guerra), o coração e o fígado respectivamente. 3 - Amar é se equilibrar o tempo todo numa corda bamba, sacudida por dúvidas tempestivas ouvidas de dentro ( de nós mesmos) quanto de fora ( dos outros). 4 -  Amar é quase um morrer no afã de, com o nosso amor,  deixar o outro vivo, quando este também não morre. 5 - Não ame , pois, nada que em você mesmo não apalpe! 6 - Mas , não  esmague nem a si e nem o outro num gesto de carícias. 7 - Lembre-se da natureza ambígua de Eros: a linha entre devorar e ser devorado é muito tênue! 8 - Eros, quando puxa ao pai, Ares, costuma  inventar conflitos, fazer tempestade num copo d'água… 9 - Eros, quand

Da série psicanálise e & provocações (II)

  O assombroso ato de se conhecer: o nosso engatinhar! Por Gilvaldo Quinzeiro 1 – O problema do homem, não é quando este anda sobre “quatro patas”, jardim da sua infância, mas quando passa a fazer uso apenas de duas, que, estando em desequilíbrio e arrogância, esquecerá do seu passado, vindo, mais tarde, a vergonhosamente desconhecer a si mesmo e dos outros, quando, para se erguer, precisará se apoiar em três patas... 2 – O ato de conhecer a si mesmo é potencialmente assombroso! Por isso, as vezes é mais confortável servimos de cavalo aos nossos sintomas – pernas e caminhos do nosso lugar algum! 3 – Sigmund Freud viu muitos desses cavalos derrubarem gente grande! 4 – Ah! Este Freud! Como explicar a dor de não ser correspondido pelo próprio espelho? 5 -   A velhice, esta incômoda visita, assombro de todos as faces, mas que nem todos, devido a pressa, e outros penduricalhos, terão o privilégio de confortavelmente recebê-la -, é o nosso reencontro com aquilo que é o nosso et

Da série psicanálise & provocações (l)

Os eternos bebês no quarto  Por Gilvaldo Quinzeiro  1 - Mais do que um conflito entre a geração dos pais e filhos, típica dos anos 60 , 70 e 80, estamos tendo agora a edificação de uma nova topografia: mundos de fachadas; bolhas narcisicamente tóxicas; sujeitos desenraizados a surfar em rasas ondas! 2- O Édipo de hoje não possui “pés inchados”, pois pouco se pisa no chão, mas a boca rasgada pelo desejo traidor de permanecer no quarto. 3 -  O cordão umbilical se encompridou, mas o mesmo não se pode afirmar sobre a fartura de  seios . 4 -Há choros e gritos silenciosos; viagens a paraísos e guerras deflagradas ao mundo sem sequer deixar  o quarto. 5- O quarto não pode ser pensado no singular , mas numa profusão de significados - uma espécie de extensão do útero. 6- Por ausência dos pais,estes,  também presos em seus mundos de mentirinhas, há introjeção da imago dos monstros de pelúcias ou dos animais de estimação por parte dos filhos - únicos visitantes deste escuro quarto (?). 7 - É urge

Natal: em Belém?

  Por Gilvaldo Quinzeiro Hoje em Belém, na Cisjordânia, não há Natal! Todas as comemorações alusivas ao nascimento de Jesus Cristo foram suspensas. Os bombardeios israelenses em cursos desde o dia 7 de outubro na Faixa de Gaza e região adjacente destruíram também as festividades. Há sim, um presépio improvisado feito dos escombros da guerra, sobre os quais repousa um menino vestido de trajes palestinos – o menino Jesus! Em suas orações ontem, 24, na Missa do Galo, o Papa Francisco disse: “nesta noite, o nosso coração está em Belém, onde o príncipe da paz ainda é rejeitado pela lógica poderosa da guerra, com estrondo das armas que ainda hoje o impede de encontrar alojamento no mundo”. Se se Jesus tivesse vindo ao mundo no exato dia de hoje, ele, e outras milhares de crianças palestinas cujas mães morreram e continuam a morrer em face da guerra - não encontraria “Belém”, apenas escombros de corpos! É estranho que os mesmos que se dizem preparados para à volta de Jesus, não cons

Sim, primo, está claro?

Por Gilvaldo Quinzeiro Antes do domínio do fogo e da escolha das pedras para se fazer uma trempe, a distinção entre a carne da caça e da mão ensanguentada do caçador era feita no ato também violento de morder; de morder aquilo que poucas horas antes era escorregadio e saltitante.   Entretanto, foi a dança entorno da fogueira, que deu um novo sentido do que é ter uma barriga cheia – cheia também daquilo que agora se formata na condição de um espirito! É estranho hoje nos perguntar no entorno de que ou de quem dançamos? Porém, o mais estranho é constatar que não sabemos mesmo por onde andam as nossas mãos, quando tudo é tão próximo da nossa boca. Aliás, o que engolimos não nos faz ter espirito algum? É claro que hoje tudo é boca:   é impossível atravessar os espelhos sem ser devorado pela experiência das sombras!  

A fartura das mesas, e a nossa fome de afetos!

Por Gilvaldo Quinzeiro   Dizer “eu te amo” de pau duro é muito fácil. O difícil é amar para além das condições em que as fraquezas da carne, fraqueza no sentido de não ter mais carne ou de não despertar apetite na forma de prato algum, nos obrigam a redesenhar o mapa da ceia! Abraçar alguém quando este é fonte dos seus interesses, é fácil. O difícil é conciliar os seus interesses com os de quem está sendo servido no prato – isso a propaganda ou as mensagens e os convites para a ceia natalina não nos despertam! – Ainda bem? Quando chegamos a uma certa idade, já sabemos de cor e salteado os cheiros dos assados e dos cozidos, e até mesmo dos presentes que recebemos com desgosto todos os anos! Sim, parece que com o passar dos tempos, temos mais de um Nelson Rodrigues do que de uma Ana Maria Braga! Sorte nossa?   Cadê os velhos amigos? Cadê os sonhos, os pratos, os caminhos em que todos juramos seguir juntos? Às vezes bate uma saudade diante da certeza de que a farofa era o melh