A fartura das mesas, e a nossa fome de afetos!
Por Gilvaldo Quinzeiro
Dizer “eu te amo” de pau duro é muito fácil. O difícil é
amar para além das condições em que as fraquezas da carne, fraqueza no sentido
de não ter mais carne ou de não despertar apetite na forma de prato algum, nos
obrigam a redesenhar o mapa da ceia!
Abraçar alguém quando este é fonte dos seus interesses, é fácil.
O difícil é conciliar os seus interesses com os de quem está sendo servido no
prato – isso a propaganda ou as mensagens e os convites para a ceia natalina
não nos despertam! – Ainda bem?
Quando chegamos a uma certa idade, já sabemos de cor e salteado
os cheiros dos assados e dos cozidos, e até mesmo dos presentes que recebemos
com desgosto todos os anos! Sim, parece que com o passar dos tempos, temos mais
de um Nelson Rodrigues do que de uma Ana Maria Braga! Sorte nossa?
Cadê os velhos
amigos? Cadê os sonhos, os pratos, os caminhos em que todos juramos seguir
juntos? Às vezes bate uma saudade diante da certeza de que a farofa era o
melhor que tínhamos a oferecer!
Mas a farofa aqui não é necessariamente aquela feita de
farinha. É a farofa dos sonhadores.... Enfim... uma canção tocada na vitrola
enquanto todos ouviam tudo em silencio ritualístico. É dessas
coisas que tenha saudade! Sei lá...
Lembro-me da fartura de um velho ditado: quem não pode com a
rudia, nem tente pegar no pote! Hoje, com a escassez de discernimento, um copo descartável
nos poupa dos nossos vazios de afetos?
Infelizmente, a fartura da mesa ou o pisca-pisca das arvores
de natal recheada de caros presentes não nos impedirão de seguirmos todos
famintos por afetos!
Ufa! Meu celular tocou!
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