Quando uma imagem nos devora?



Por Gilvaldo Quinzeiro




Pintura de Gardênia Silva

A impressionante obra de arte acima é de uma aluna, Gardênia Silva, do 2º ano D, do Colégio Militar Tiradentes IV. Ao ver tal obra, de cara, fiquei mudo de alguma forma! E não pude conter o meu desejo de tentar captar não só    o seu aspecto visual, mas sobretudo o ‘auditivo’ – o meu jeito de dialogar com o imagético. É claro que isso não me seria possível sem antes também ouvir a autora!...
A propósito, este texto ainda que partindo de uma imagem, não é do imagético que se ocupará, e sim da escuta. De imagens estamos todos ‘empanzinados’, se antes as escutássemos não teríamos os nossos olhos fixos com tanta tristeza no futuro – tal como a imagem aqui aludida – esta não está à espera de quem simplesmente a contemple, mas sim de quem a ouça(?).

Uma imagem quando não captada a partir da escuta, ela não é outra coisa senão uma ameaçadora esfinge que, tal como na Mitologia está à espera de ser decifrada: “decifra-me ou te devoro”!

Pois bem, por falta desta escuta é que estamos sendo ‘devorados’ por uma realidade cuja égide está centrada na ordem do imagético. Em tempo das chamadas “fake news”, mais do que nos emprenharmos de e pelas imagens, precisamos desenvolver o quanto antes, o nosso processo de escuta.

Era costume entre muitas tribos indígenas se colocar o ouvido postado ao chão para se captar os acontecimentos em marchas em direção à tribo ... O caboclo ‘assunta o tempo’ quando quer se posicionar em relação a algum fato ou simplesmente dar início a uma tarefa! Ao ouvir o som dos tambores, os escravos não só ressignificavam a sua dura existência, como sentiam na pele um certo alívio para suas dores!

Ouvir uma ‘imagem’, portanto, é ter superado a barreira do mundo sensível – mundo ao qual estamos perigosamente presos, conforme Platão (428 a.C.   – 348  a.C. ) -  e se colocar em posição de Mestre, a exemplo dos antigos.

Ouvir uma imagem é decifrar os seus enigmas; é ir além da imediatidade das coisas, e não ser abocanhado por estas.  

A intolerância, fato este tão presente em nosso tempo, onde reside? -  senão na falta de escuta! E mais do que isso, a falta de escuta incide também na imagem espraiada   que muitos jovens têm de si – seria este o motivo   das vozes alucinatórias – uma espécie de ‘chamado’ nas queixas de muitos com tendência ao suicídio?

Os pais precisam, e com urgência, escutar seus filhos, ainda que isso signifique não ter olhos para outras coisas. Os filhos, por sua vez, necessitam ouvir os pais, ainda que isso signifique ‘furar’ os próprios olhos, isto é, deixar ainda que momentaneamente de estarem   fixos na mesma coisa.

O fato é o quão é importante a escuta. E como costumo falar, evitaríamos muito dos nossos desastrados atos se se atendêssemos o seguinte procedimento auditivo: primeiro devemos escutar; segundo, devemos interpretar o escutado e em terceiro devemos nos posicionar. Tal processo só nos será possível se antes educarmos a nossa alma em pavor.

Por fim, e voltando à imagem retratada na obra acima: como não envelhecer os olhos e a pele com a visão fixa naquilo em que não se viceja com os ouvidos?



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