A bruta realidade e a sopa de besouros. Uma teoria sobre as rachaduras do nosso tempo

 

Por Gilvaldo Quinzeiro

 

A realidade, que já era um ‘prato de sopa quente, agora perdeu o fundo: de comedores pelas beiradas, passamos a ser a própria sopa derramada! Mas, não pense caro leitor que todos nós temos a noção disso. Não! Muitos acreditam ser o tempero da sopa, isto é, se acham indispensáveis a todo e qualquer processo. Mas, cá entre nós, eu não troco o meu ‘feijão com arroz’ por quem pretenda ter a   mais sofisticada das interpretações!

O dito acima é uma breve introdução à teoria das rachaduras. Ou seja, a tese de que passamos a viver em fendas como uma espécie de besouro, de onde acreditamos ver tudo; compreender tudo; Poder tudo; ser tudo (qualquer ilação ao mito da caverna de Platão não será, enfim, mera coincidência).

Ora, as chamadas teorias da conspiração que crescem como germes, e ameaçam como nuvens escuras a tomar conta de tudo, nascem do interior dessas fendas. Aqui os ‘besouros’ conseguem ver tudo, menos a morte da árvore em que estão encravados!

Aliás, combater o uso da vacina tão necessária para conter a expansão da pandemia; relativizar os danos do desmatamentos ou os números de mortos da Covid-19; se indignar mais com as vitrines quebradas das lojas do shopping, do que com a morte de um negro – isso já é apodrecer de alguma coisa!

Vivemos em fendas, de onde tornamos tudo tão obscuros, e quase sem  nenhuma saída.  Vivemos em fendas de onde queremos ‘encaixar’ também os céus.

Mas a questão não é tão simples assim. Os ‘besouros’ se acham sofisticados. Das rachaduras onde estão encravados são capazes de flertarem com o mundo lá fora. Há uma rede de labirintos pelas quais escoam seus excrementos. E eles conseguem operar bem!

Precisamos estar atentos a essas ‘rachaduras’! É daqui que partem grande parte dos ecos que escutamos todos os dias. Ecos ensurdecedores, diga-se de passagem. Ecos capazes de entortar os pilares que até ontem acreditamos serem sustentadores da nossa realidade.

Até mesmo ‘Deus’ foi transformado a partir dessas rachaduras a um mero cumpridor das vaidades e soberbas humanas. Frases como “Deus é fiel” para justificar, por exemplo, uma vingança as vezes até com morte, em uma contenda entre vizinhos, é rebaixar o Criador a uma coisa qualquer.

Deus? Meu Deus! Enfim, como diria Protágoras, “o homem continua sendo a medida de todas as coisas”.  

 

 

 

 

 

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