O carnaval e suas releituras


Por Gilvaldo Quinzeiro

Desde os gregos antigos, quando se celebrava a festas dionisíacas, o sangue tão presente nas guerras e na luta diária, era substituído pelo vinho; a realidade que comprimia os corpos, era substituída pelas asas da fantasia –, melhor assim do que não conseguir colocar o dedo na ferida ou a ferida na fantasia?

O carnaval, que agora toma conta das ruas de todo o Brasil, é claro que não evita as feridas ou a morte nos acidentes; na violência das gangs de jovens também comuns neste período, infelizmente, contudo, como estancar o que na realidade escorre como rio caudaloso – um misto de fúria e angustia? 

O carnaval é uma espécie de alquimia, assim como as festas dionisíacas. Tanto aqui, no carnaval, quanto lá, nas festas dionisíacas, a carne ferida era transformada em fantasia!

Nestes dias, eu falava com um colega que está a pesquisar sobre o riso. Disse a ele algo muito parecido com o que agora escrevo: em todos os grupos humanos, seja na família, seja numa igreja, seja num ambiente de trabalho, seja até mesmo num velório ou numa guerra, as condições farão com que surja alguém “parido para o riso”! De sorte que, de outra forma, tudo nos seria insuportável!

Rimos com os mesmos músculos faciais que se contorcem quando nos irritamos. Sair desse atoleiro, a irritação, é recriar a topografia que torna os corpos peças fixas.

As pinturas rupestres, imagino, surgiram nestas condições de se driblar os temores vindos do mundo exterior! E assim, podemos dizer que a arte é prima das primeiras fogueiras a afugentar a escuridão e seus inquilinos!

Ora, o profano e o sagrado são faces a se contorcerem ao lamber a mesma ferida! No final das contas, ou estamos diante de um cortejo fúnebre ou diante daquilo que se pode também carnavalizar!

Amém?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A roda grande passando pela pequena

Os xukurú, e a roda grande por dentro da pequena...

Medicina cabocla