A folha, a lagarta e a borboleta*

Gilvaldo Quinzeiro



O que restará a uma folha caída no chão de uma floresta?

A resposta a esta pergunta é mesma que tem o poder de fechar as bocas famintas das lagartas que já se põem a devorar a folha, isto é, o poder da transformação!

Dito de outra forma, a folha, ainda que sendo devorada pelas lagartas estará contudo,  de volta ao alto das árvores   no voo das borboletas. Aliás, quão nos é difícil acreditar que uma linda borboleta antes de voar era apenas uma lagarta que de alguma forma se serviu da folha que até então se encontrava no alto da copa das árvores!...

Na verdade, na verdade, a transformação não é só uma rotina da natureza, mas, sobretudo, o seu próprio jeito de ser! A natureza só é natureza porque tem em si mesma a transformação. Do contrário como explicar, a passagem do sertão para o mar e do mar para o sertão?

Pois bem, dito inicialmente da existência e do poder da transformação, quero lhes dizer que todos nós seres humanos temos e somos uma natureza, e que assim como uma folha caída no chão, podemos estar agora nos sentindo devorados – devorados pelos nossos próprios fantasmas! Fantasmas tão famintos quanto às lagartas a devorar a folha!...E, nestas condições, assim como no exemplo da folha nos cabe ao menos uma pergunta: o que nos restará a fazer quando o chão já se tornou duro demais de tantas e tantas quedadas nossas?

A resposta a esta pergunta não poderia ser outra, ou seja, nos restará apenas a transformação!

Ocorre, no entanto, meus caros que a natureza humana é muito mais complexa do que já ousamos imaginar. Em outras palavras, nós podemos ser a folha que alimentou a lagarta, a lagarta que se transformou em borboleta, e, mais do que a borboleta, nós podemos ser o voo que borboleta alguma com toda a sua transformação pode alçar!...

E é exatamente neste voo que só nós podemos alçar que  está não só a nossa diferença em relação a borboleta, mas, fundamentalmente  a nossa capacidade de nos transformar em algo para além do que a borboleta nunca  poderá  vir a ser .

Meus caros ouvintes, senhoras e senhores, a transformação humana da qual falo não poderá ser alcançada, senão, como bem diria o grande filósofo grego Sócrates: conhecendo a si mesmo!

Eis o mundo a conquistar! Eis quem conquiste o mundo todo, porém, poucos são os que percebem que a verdadeira e a maior de todas as conquistas – é a conquista do seu mundo interior!

Quantos de nós somos apenas a folha que desconhece as suas raízes? Quantos de nós não conseguiremos passar da condição de lagarta por desconhecer em nós a borboleta que  já se contorce? Quantos de nós em chegando a condição de borboleta, mas  por desconhecer a realidade da copa das árvores, onde se encontra a folha  que alimentou a lagarta, não será facilmente comidos pelo cameleão camuflado?

Portanto, conhecer a si próprio, como a condição de também conhecer o mundo é adquirir asas que decolam para além do ninho que atraem as raposas!

 *Este texto foi escrito para uma palestra dirigida  aos presidiários, atendendo um convite da Pastoral Carcerária.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A roda grande passando pela pequena

Os xukurú, e a roda grande por dentro da pequena...

Medicina cabocla