A coisa, a palavra e o feitiço
Por Gilvaldo Quinzeiro
Há coisas na palavra que se restringem ao âmbito das
palavras, e não diz respeito ‘a coisa’ propriamente dita –, aquela que grita em
nosso silêncio, e que, portanto, não se ‘palavrisa’, é saliva, gemido, tremor
ou desfalecer!
Somos ‘ocos’ daquilo que a palavra não representa ou somos ‘barros’
daquilo em que somos fincados apenas com o emprego das palavras. Ora, o dito
aqui é espantoso! E chama exatamente a nossa atenção para a nossa condição de
meros ‘espantalhos’ – aqueles que representam o lugar dos vivos, embora não
sendo coisa alguma; dos vivos que ora se fingem de mortos -, têm a difícil
missão de afugentar aquilo que pode trazer a representação da morte!
Qual a explicação da nossa atual tendência, que não é nova, a de
tatuar o corpo, senão a intenção de nos prender a alguma coisa que as palavras
já não mais exorcizam?
O feitiço o que é? Um misto da coisa/palavra. O que é um
sintoma? A coisa plantada na condição de palavras, não para ser a palavra, mas
apenas para ser a coisa que se dissipa quando bem ouvida.
Ora, ‘o diabo’ desta nossa conclusão é a seguinte: a falta não de ‘feiticeiros’, mas de quem seja capaz desfazer o feitiço. É aqui que
nos remetemos a um problema, qual seja, da abundância da nossa boca, e da
escassez de ouvidos.
Enquanto não sabemos quem somos e nem o que buscamos, nestes
nossos atuais dias, onde há mais coisas do que palavras, posto que estas nada
mais representam a coisa, temos como consequência disso uma coisa pela qual nos
dar um sinal de vida: o grito da nossa angustia!
Portanto, o não vivido, vive em nós para sempre, não como o
não vivido, mas como o que vive em nós a espera de ser vivido. O não vivido é a
‘despalavra’ que só se palavrisa quando vivido!
Comentários
Postar um comentário