A pandemia e a crise da verdade. O que é a verdade?


Por Gilvaldo Quinzeiro


A crise provocada pela pandemia da Covid-19, para além de ser um problema de ordem sanitária, econômica e social, é, num sentido mais amplo também uma crise civilizatória. E neste sentido, como não poderia deixar de ser, o homem enquanto engenho e visão de si mesmo, bem como do mundo, está sendo triturado. O triturado aqui, não é contudo, no sentido negativo, embora há que se entender o seu sentido destruidor.

 Este texto, portanto, tem uma pretensão ensaística, caso essa palavra em seu sentido literário, caiba aqui.  O certo é que faremos um gigantesco esforço mental para ao menos chamar atenção para a complexidade da crise atual. Vejamos!

Ao olhar para a gravida da situação, eu tenho procurado traçar um paralelo entre outras crises sanitárias ocorridas a partir de um viés histórico/ filosófico (por que não?), a exemplo, da peste negra no século XIV e da gripe espanhola em 1918.  O que essas pandemias distantes em termos temporais têm a ver com a crise atual? É claro que a pretensão dessa natureza é bem maior do que a nossa capacidade de gerir e pensar sobre o assunto. Entretanto, não podemos negar que já nos debruçamos sobre o problema.

A respeito desses paralelos, entre uma crise e outra, podemos encontrar vários traços comuns; traços estes já descritos em trabalhos de pesquisas ao longo desse tempo por diferentes autores.  Porém, o que eu vejo, mesmo correndo risco de que tal visão seja resultado de ‘miopia’, é o ódio, seja este por motivo religioso, como no caso da peste negra – presente nas cruzadas ou político, como o da gripe espanhola – presente no desfecho da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Creio que dispensa dizer do ódio, que toma conta dos nossos corações nos dias atuais. Do ódio, diga-se de passagem, com as suas raízes religiosas, políticas, ideológicas. Será isso uma mera coincidência?

Há um outro elemento que eu gostaria de acrescentar as condições atuais: a crise em relação a ‘verdade’. Aliás, o que é a verdade? Tal crise também se fez presente no tempo de Jesus Cristo(?).   Será por isso a razão do eloquente silencio de Jesus quando interrogado por Pôncio Pilatos a respeito do que é a verdade?

Ora, o que chamamos de ‘crise da verdade’ é uma consequência direta do ódio. Como assim? O ódio em qualquer circunstância nos infla e consequentemente nos cega; nos faz perder o discernimento.  Assim sendo (imagino), qualquer resposta de Jesus Cristo não teria alterado aquelas circunstâncias...

O que é verdade?  Nem que soubesse, eu diria, posto que a verdade é contextual, de tal modo que essa só é ‘verdade’ a quem tem a força e o interesse para impô-la.  Não isso o que está acontecendo nas nossas circunstâncias?  Veja a dimensão que a pesquisa ou uso da vacina contra a Covid-19 tomou por causa disso!

Há uma guerra de retórica sendo travada neste momento. Uma guerra, que ganha diferentes nuances. Uma dessas nuances, por exemplo, diz respeito a qual ‘verdade’ que prevalecerá no pós crise. Ou seja, algo que vai nos remeter diretamente a questão de natureza geopolítica. Enfim, que ‘verdade’ dominará o mundo e estará a serviço de quais interesses?

Se é um fato que a ‘crise da verdade’ seja um dos aspectos centrais da nossa crise atual, ou seja, da pandemia da Covid-19,  eu acredito que sim, então, haveremos de concordar que há muito tempo ao invés de homens, temos nos transformados em meros ‘sabugos’. ‘Sabugos’? Como assim? Veja as atitudes das nossas principais autoridades neste atual contexto? O que tais atitudes revelam, senão a falta de Homens?

Ora o que são as fake news, senão o fundo do fundo da nossa pior crise!  A crise em que todos os pilares, que dão sustentação a nossa civilização estão seriamente comprometidos.  Alguém tem dúvida da gravidade dessa crise? 

Por fim, neste sentido, a tragédia provocada pela Covid-19 poderá ser tão mais grave do que podemos pensar!  Por exemplo, em breve, se nada for feito, poderemos estar a enterrar uns aos outros vivos, posto que em certo sentido, já estamos todos mortos! Mortos porque já perdemos a base para o discernimento. Discernimento que é uma peça chave para salvar a humanidade. O uso ou não da vacina, é, por exemplo, uma questão de discernimento em relação a uma tomada de decisão diante da gravidade da situação!

Verdade?

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A roda grande passando pela pequena

Os xukurú, e a roda grande por dentro da pequena...

Medicina cabocla