A GRAVIDEZ DAS VIRGENS




Gilvaldo Quinzeiro


Tal como uma adolescente precocemente grávida filha de pais austeros e conservadores, a igreja católica vive hoje o dilema de ter que se explicar para o mundo, e em especial, aos seus fiéis, o caso dos padres pedófilos que mergulha todo o catolicismo apostólico romano numa grave crise. Ou seja, uma situação dramática que coloca em xeque segundo alguns analistas até a autoridade papal. Situação que pela sua dramaticidade inspiraria William Shakespeare a escrever o drama “o parto das virgens”.

Recorrendo à Psicanálise que desde Freud adentra os porões da escuridão humana provando a existência de uma força avassaladora imanente à natureza humana, a libido; força esta, ainda que negada pelos mais apaixonados racionalistas, e subestimadas pelas nossas mais tradicionais instituições, provoca estragos e inundações, derrubando conceitos e destruindo pensamentos, sobretudo nos mais incautos – queremos fazer uma reflexão desta questão, sem a pretensão de prejulgamento ou de esgotar a discussão. Pelo contrário, entendemos que este é um assunto complexo, e que portanto, há de ser analisada por deferentes ângulos. O que faremos aqui é apenas levantar a questão sob o nosso olhar.

Pois bem, partindo de um ponto de vista “psicanalizante” refletiremos o seguinte:
Primeiro, os padres solteiros e “virgens,” filhos de uma mãe, a sagrada igreja que prima pela castidade e pela devoção.

Segundo, uma igreja cujos pilares se sustentam liturgicamente no culto de Maria que concebeu um filho, Jesus Cristo sem ser, contudo, desvirginada. Ou seja, homens que em nome da fé e da sua mais sagrada missão esconde sua sexualidade, tal como se joga o lixo por debaixo do tapete, faz escorrer seus desejos carnais num cenário celestial, a igreja, “brincando com as criancinhas”; identificando-as e a si com os seres angelicais. Isto é, uma espécie de retorno aos contos de fadas, onde tudo é “inocentemente” possível. A realidade humanamente vivida, no entanto, prova que aqui os “anjos” não só tem sexo, como o praticam, e pevertidamente, diga-se de passagem.

Terceiro, as criancinhas, diga-se de passagem sem a maturidade sexual, isto é, sem as genitálias desenvolvidas, e, também virgens, completando assim, o que vamos chamar de “arquétipo da inocência”. Portanto, um cardápio perfeito para quem foi ensinado a só se “alimentar de coisas espirituais”; um “chapeuzinho vermelho” para um faminto “lobo mau”. Aliás, conforme o desenrola da “cena infantil” o lobo faz de conta que é um cordeiro, e  a é criança lambida! Ou seja, ao nosso ver a igreja, está diante de um dilema que vai dos contos infantis a um drama Shakespeareano, “ser ou não ser, eis a questão”.
Em outras palavras, aqui reside um paradoxo, o calcanhar de Aquiles da igreja católica bem como de toda a sociedade, a saber, qual o papel da igreja católica na edificação e valorização da família, se o principal símbolo do cristianismo, o próprio Jesus Cristo nasceu de uma relação não familiar, isto é, não foi gerado do relacionamento entre uma esposa e o marido? Se o ato em si é tão vergonhoso, como então se pode enaltecer a família cujos filhos nascem de uma relação sexual entre o marido e a mulher?

Portanto, este é um assunto sério que merece um profundo estudo, não só do clero, mas também dos pensadores, bem como de toda a sociedade, a fim de que possamos compreender as bases culturais, teológicas e filosóficas que sustenta a nossa civilização ocidental.

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