O AFUNDAMENTO DAS CIDADES
Gilvaldo Quinzeiro
Contar os mortos sob os escombros das “tragédias anunciadas”, tal como a que ocorreu no Rio de Janeiro, é tão trágico e desumano, quanto contar os votos “comprados” às claras e descaradamente dos mesmos miseráveis que jazem nas áreas de risco das grandes e médias cidades brasileiras e que elegeram quem hoje apenas mandam as escavadeiras para desenterrá-los.
As cidades se afundam no fundamento de uma sociedade eleitoralmente vampiresca, onde o sangue derramado é menos importante que o poder auferido pelo dinheiro. Ou seja, aos pobres os lixões, os morros e a lama, e dos pobres o voto que lhes afundam ao eleger quem os empurram para debaixo dos escombros. Aliás, o soterramento dos pobres sempre foi uma política das elites brasileiras – uma solução para desenterrar os votos; os votos que as mantêm confortavelmente no poder.
Em outras palavras, somos uma sociedade cujos valores são edificados na lama, a mesma lama que nos atola e nos soterra impotentemente. Uma sociedade “sifilizada” por uma classe política, que se fortalece a cada caixão de defunto doado aos familiares das vítimas pobres, bem como a cada carrada de barro e de telha cujas casas são construídas nas áreas propicia ao soterramento de toda a família.
Eis portanto, a engenharia que edifica cidades como se engendra uma bomba-relógio, a saber, o voto que elege a elite política é também o que soterra o eleitor pobre.
Em Caxias, os moradores da rua Aluizo Lobo, bairro São Francisco para evitarem um soterramento se uniram e tomaram a iniciativa de realizar as obras de contenção das encostas dos morros. E é claro que não deixaram satisfeitos muitos políticos locais que aguardavam acontecer uma tragédia para oferecerem “velas e flores” nos velórios!
E quanto às outras áreas de risco da cidade? Os moradores já podem encomendar seus caixões?
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